segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O Palhaço e o silêncio



A alegria do circo é o palhaço


Os primeiros trinta minutos de “O Palhaço”, novo filme do ator e diretor Selton Mello, me causaram estranheza e um certo incômodo. E quando minha mente agitada esperava algo que movimentasse mais o enredo, via sutilezas de interpretação e silêncio.

Tudo no filme é simples: as piadas, as risadas, as falas, os personagens, a trama, o clímax e o “gran finale”. A leveza e o ritmo com que o diretor conduz a história do palhaço Pangaré são quase que uma agressão ao imediatismo, a instantaneidade e ao excesso de barulho que vivemos em nosso tempo. Esse choque me levou a refletir sobre minhas escolhas. Pensar acerca dos meus desejos e sonhos que quero realizar. E, principalmente, abrir os olhos – e os ouvidos – para o relacionamento que estabeleço com o silêncio.

O personagem de Selton Mello é inquieto. Mas é um inquieto silencioso. Observador e de poucas palavras. Conduz seu conflito interno de modo real e fantasioso. Ele sofre. E tem dúvidas. E precisa saná-las para seguir adiante. Ele quer o apoio familiar e vai de encontro ao seu pai quando decide se afastar. Na simplicidade dos seus gestos ele ousa ir à busca de um desconhecido que poderia mudar sua realidade. Na mesma leveza com que convive com seu drama ele reencontra no meio do caminho aquilo que ninguém pode fazer tão bem quanto ele mesmo. Talento, dom, carisma. Cada ser humano tem o seu. O do palhaço é fazer rir.


Paulo José  e Selton Mello fazem Puro Sangue e Pangaré


Percebi que aquilo que é bom em mim precisa aflorar. E desatinei a escrever este texto até alta madrugada. As palavras vinham e as lembranças das cenas se confundiam com meu cotidiano. Como todo ser humano, também sofro, tenho dúvidas, me inquieto.

Pensei ainda que se, de fato, nós seres humanos fôssemos promotores da singularidade uns dos outros, veríamos que a inveja não nos acrescenta em nada. Nossa ânsia por sermos os melhores de todos, sempre, seria vã. O desejo de tudo ter se converteria em apenas ser quem somos e ponto final. A humanidade agradeceria o esforço pessoal de cada um e certamente viveria mais em paz. Podemos tentar ser algo diferente?  Porque não? O que nos marca não são os títulos que recebemos por nossos feitos. São nossos dons e nossa capacidade de fazer bem feito aquilo que só a gente, com nosso jeito, sabe fazer. Nossa missão aqui nesta Terra passa por isso.

O silêncio me fez reencontrar comigo mesmo. E levei para casa a percepção de que preciso silenciar mais, sem deixar de me inquietar também. Observar a vida com leveza. Fazer dela um passo de cada vez. Não querer tudo para anteontem. Tentar sim, e sempre ter a certeza de que é infinita minha capacidade de recomeçar. “Porque os gatos bebem leite, os ratos comem queijo. E eu?” Sou jornalista!  (Thiago Camara)

Assista abaixo o trailer oficial do filme O Palhaço: 


quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Ser Invisível





Estranha mania do ser humano em priorizar certas coisas... Ama-se o animal de estimação com afeto extremo, profunda admiração e carinho, mas é incapaz de ser gentil com o seu filho ou marido (esposa) no convívio diário e na hora de levá-los para passear.

Nutre uma paixão avassaladora e dependente pelo futebol, mas esquece de quem o espera ansioso voltar dos seus momentos de catarse, desejando só alguns minutos de atenção.

Precisa de tantos cremes, perfumes e tintas para se embelezar e esquece de traduzir beleza em gestos que, de fato, poderiam encantar seu próximo, interna e externamente.

É dotado da capacidade de ser agradável, amável e acolhedor e sequer desenvolve estas habilidades quando se depara com um semelhante, acuado, deslocado, isolado.  

Como pode uma sociedade que se diz tão evoluída, mas não consegue enxergar o outro ao seu redor?
São muitos os seres invisíveis que vivem de carne, osso e alma perambulando entre nós. Gente que, no meio dos seus, tenta algum artifício para chamar atenção e ninguém vê. Vão para as redes sociais e expõem suas tristezas mais doídas, suas carências mais vivas, em busca de um comentário que lhe seja destinado. Corações que sofrem a exclusão de outros insensíveis corações que não conseguem abrir mão das práticas egocêntricas e egoístas. Somos todos iguais? Desde que seja cada um na sua. E a humanidade que nos liga fica relegada a um segundo ou terceiro plano.

O ser humano é cheio das contradições. Diante de realidades visíveis, prefere o comodismo de fingir que não existem esses seres invisíveis. Vai ver que foi por isso que ainda naquele tempo, Jesus Cristo mandou na lata: “Amai ao próximo como a ti mesmo.” Mas pelo visto, tá difícil viver isso e cada vez mais fácil ser invisível. (Thiago Camara)