Outras cenas urbanas são gentilezas que fazem parte do nosso dia a dia |
Duas cenas clássicas do cotidiano urbano. Tinham tudo para dar errado. E reforçariam minha certeza de que a humanidade está perdida, de que o “olho por olho, dente por dente” é o que prevalece, de que o homem é um idiota mesmo que vai morrer sozinho com seus gadgets, tablets, Iisso, Iaquilo, porque só sabe se relacionar com – e por meio das – as máquinas.
Fui surpreendido.
Chegava a uma Ipanema de sol a pino em pleno primeiro sábado do mês. Praia lotada, todo mundo querendo se preparar para o verão. Devia ter gente de todo lugar da cidade. A Lagoa Rodrigo de Freitas, ali bem próxima, estava com seu entorno quase que todo interditado para estacionamento. Eu e minha namorada tínhamos um compromisso no meio da tarde, neste cenário, e precisávamos de uma vaga para estacionar o carro. Rodamos um pouco e, incrivelmente, na Visconde de Pirajá (rua principal do bairro) vimos um cidadão colocando uma toalha na mala do seu veículo. Pensamos: “ih agora que nos viu parados, vai fazer hora, fingir que não está nos vendo, só pra ter o prazer de jogar na nossa cara que ele sai da vaga na hora que ele quiser...” e outras coisas que os cariocas adoram fazer nos estacionamentos dos shoppings centers. Perguntamos se ele ia sair. E ele veio até o nosso carro e “todo preocupado” disse: “Vocês podem esperar um pouquinho? É que meu caro está fervendo (estava no sol) e eu estou esperando minha esposa que entrou ali na galeria”. Olhamos um para a cara do outro e pensamos em voz alta, claro! Acertamos na loteria. Uma vaga em Ipanema, em dia de sol.
Como se não bastasse, a gentileza do nobre cidadão continuou. Vendo que a esposa demorava além da conta nas vitrines da galeria, ele preocupado em nos fazer esperar ainda mais, foi atrás dela, a apressou para entrar no carro e sair para dar lugar a nós. A esposa chegou com a filha. A menina entrou no banco de trás com o pai e a mãe seguiu ao volante. Antes que ela terminasse a manobra, o nobre cidadão ainda virou-se para trás, acenou e deixou na gente uma sensação de esperança e certeza de que educação e gentileza são inspiradores nos dias de hoje. Ganhamos o sábado.
A outra cena foi no Grajaú, bairro em que moro. Estava saindo de casa para fazer natação e tocou o interfone. Era o porteiro dizendo que o vizinho de umas quatro casas para trás estava lá embaixo reclamando que nosso carro, que fica na rua, estava atrapalhando seu entrar e sair de casa. Detalhe o carro já estava parado na frente da casa dele há alguns meses. Já desci, pensando no pior. Ao chegar à portaria me deparei com um senhor de cabelos brancos, muito educado, simpático e que ficou me pedindo desculpas por estar me importunando. “Imagina, vamos lá resolver isso”, eu disse quase que emendando num convite para ele subir e tomar um café comigo. Na porta de sua casa, coloquei o carro poucos metros para trás e acabei com o incômodo que o estava inquietando. Ele me agradeceu demais e pediu também mais desculpas por ter tomado meu tempo. Resultado: conheci um vizinho educado, prestativo, simpático, gentil. E tive a certeza de que há muitas mentes e corações bondosos e solícitos escondidos nos nossos centros urbanos. Pena que encontrá-los me causou tamanho espanto inicial e vontade de escrever este texto para disseminar esses gestos simples para além do meu peito. Poderia ser sempre assim. Ganharíamos os dias. (Thiago Camara)
Sensacional o texto Thiago!
ResponderExcluirAlgumas vezes nós vamos armados para certas situações que não são de guerra. Mas como você mesmo presenciou, ainda há SIM muita gente de bem nesse mundo. Só nos basta lembrar disso o tempo todo, sermos também uma pessoa de bem e transformar aquelas que ainda não são. Se conseguirmos isso encontraremos a tão sonhada paz, que desejamos uns aos outros, todos os dias.
Mais uma vez, parabéns pelo texto.
Legal, Thithi!
ResponderExcluirEmanemo-nos amor =)
Queridos, obrigado pelos comentários! É bem por aí!
ResponderExcluirPodemos nos armar menos e amar mais!
Eu acredito!
Abraços!