terça-feira, 18 de junho de 2013

"O Congresso é nosso"



Eles achavam que tinham vencido. Levaram nossa dignidade. Roubaram até nossos ideais. Mas os 20 centavos nos fizeram descobrir quanto vale mudar o curso da história. O povo despertou do coma profundo. Quase duas décadas de inércia, paralisia alienante, desembocaram num grito inflamado, que reverberou pelas ruas do país.

Um formigueiro humano no Centro do Rio. Uma multidão nas ruas de São Paulo. Momentos pra eternidade. Mas nesse 17 de junho, não houve momento mais emblemático, ato mais simbólico, do que a tomada pacífica do Congresso Nacional.
O centro das decisões políticas do país virou o epicentro dos protestos na capital. A melhor representação pro que há de pior na política brasileira ontem ganhou um novo sentido. A marcha começou lenta, subindo a Esplanada a caminho do alvo final. As armas? Faixas, cartazes e o grito preso na garganta que ecoou já próximo ao espelho d´água: "O Congresso é nosso", avisavam os manifestantes.

Dez mil vozes bradando, em uníssono, contra a completa desmoralização da política brasileira. A perpetuação de Sarneys, Felicianos, Renans (e Agnelos, na esfera distrital). Os gastos abusivos da Copa do Mundo e das Confederações. Os instrumentos e mecanismos legais pra garantir a impunidade - traduzida na PEC 37.

Um movimento apartidário, que se vê agora numa encruzilhada: Que caminho seguir? Que agenda política adotar? Respondo a esses questionamentos com outra pergunta. Quem se importa? Melhor um povo que se move por várias causas do que um que se cala por nenhuma.

Brasília estancou um verdadeiro conflito DE gerações - não ENTRE gerações! Os mais velhos revivendo o passado na eterna luta pelo país do futuro que ainda não chegou.

Mas a cara do movimento tinha mesmo espinha no rosto e a coragem típica dos jovens. Eles saíram do facebook. E , como nossos pais já diziam, descobriram que viver é melhor que sonhar. Muitos deles sequer podem votar. Mas já entenderam que basta um pouco de vontade pra mudar o país. Outros, viviam uma espécie de iniciação política – não sabiam bem porque estavam lá, mas impulsionaram o movimento fazendo coro ao grito.

A essa altura, a barreira policial já não conseguia conter os manifestantes, que vinham por todos os lados. Invadiram o teto, ao lado das cúpulas da Câmara e do Senado, imprimindo um novo conceito à estéticaniemeyeriana. O monumento projetado pra que pudesse ser visto a quilômetros de distância, agora mostrava uma faceta desconhecida da cidade.

A rampa do Congresso escoou a multidão que ali se aglomerava e encurtou o caminho para a última trincheira antes da invasão, que parecia iminente.

Milhares reunidos no gramado, a apenas alguns metros do vidro que protege a casa. A veia saltava. O coração acelerava. As pupilas dilatavam. Braços em riste. Quem ali nunca sonhou em fazer justiça com as próprias mãos? Mas esse não seria o desfecho de uma noite gloriosa. Me pergunto se essas horas de tensão serviram pra amadurecer mais a democracia do país ou os jovens que ali estavam.

Histórias cruzadas que ainda vão se entremear tantas vezes - nas urnas, nas ruas ou, porque não, no próprio Congresso? Os manifestantes voltaram pra casa de alma lavada, só que o protesto não parou por ali.


O recado foi dado: ninguém aguenta mais! Eles podem até tapar os ouvidos. Fechar os olhos. Silenciar diante do povo. Mas, com certeza, sentiram o golpe. (Gustavo Serra*)
Gustavo Serra é jornalista, mora em Brasília e acompanhou a tomada histórica e pacífica do Congresso Nacional. "A casa do povo", como é conhecida, assim o foi naquela noite de segunda-feira. 

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