quarta-feira, 19 de junho de 2013

Manifestação em Fortaleza



Em Fortaleza, a seleção brasileira venceu o segundo jogo na Copa das Confederações. Mas o placar de 2 a 0 em cima do México, não foi o mais importante. Mais uma vez manifestações tomaram o país. O entorno do estádio Castelão não ficou imune. 50 mil pessoas participaram do ato de protesto contra corrupção nos gastos com os estádios. Segundo o estudante, Lucano Lobo este foi o maior ato que ele já participou, na capital do Ceará. Leia o relato feito por ele abaixo:   



“A galera começou a se concentrar no Makro, antes das 10h da manhã. Eu e alguns amigos chegamos lá era pouco mais de 11h e já tinham cerca de 5 a 6 mil pessoas. Tentamos esperar até às 12h, como ficou marcado a ato de sair, porém a galera agitou muito, muito, muito e acabamos indo.

Passamos por uma primeira barreira só da AMC (Autarquia Municipal de Trânsito Serviços Públicos e Cidadania), um órgão que cuida do trânsito. Antes mesmo da gente passar, eles retiraram os carro do caminho.
Logo quando chegamos na linha com a cavalaria, eu estava mais afastado da linha inicial.  A marcha ficou estagnada. Foram palavras de ordem para lá e para cá... Por quase 30 a 40 minutos, houve muita agitação. Ao final deste tempo, uma palavra de ordem pedia à cavalaria para recuar. Ela recuou para trás do choque, a gente avançou mais alguns metros. Alguns amigos meus, nesse momento, estavam na frente e relataram que o choque tava provocando a galera, apareceu um esquentado e a gente ouviu o primeiro tiro. Todo mundo se calou, prestou atenção, o povo da frente começou a correr mais para trás.

Depois eram começaram a ser lançadas de 15 a 20 bombas de gás por vez. A gente avançava, dispersava, se reorganizava e voltava ao ponto onde o choque estava. Isso tudo ocorreu ao lado de algumas casas, a galera subiu no telhado e começou a jogar pedras. O choque recuou. Quando a gente avançou, eles começaram de novo e encurralaram uma galera que correu para uma ‘ruazinha’. Neste local tinha um carro da AMC, e a galera virou o carro e, ou ele pipocou sozinho ou botaram fogo nele. Não deu para ver direito.

Entre 13h30min e 14h, os torcedores do jogo começaram a chegar.  Neste instante, o choque parou de jogar bomba de gás, mas partiu para o cacete de quem tentasse passar, e eles eram 300 (no início), além de um ônibus que chegou nessa hora. Com isso, e não conseguindo mais avançar, a galera partiu pela Rodovia BR 116 onde havia uma longa caminhada até a próxima barreira policial... Eu, particularmente, andei até às 16h, hora que o jogo começava. Uma companheira nossa começou a passar mal, não havia comido direito + gás +desespero+uma doença que ela ainda não tinha curado direito. Conversamos com a polícia estadual daqui, que estava fazendo o apoio e fomos para um hospital, quando eu cheguei lá o jogo tinha começado.

Conversando com outras pessoas, parece que a barricada final foi a mais agressiva. O jogo já estava acabando e eles queriam dispersar mais rápido. As balas de borracha que eram poucas, até antes, foram grande maioria, as bombas de efeito moral foram lançadas por helicópteros e etc...” (Lucano Lobo*)


*Lucano Lobo é estudante da Universidade Federal do Ceará e escreveu seu relato para este Blog. 

terça-feira, 18 de junho de 2013

"O Congresso é nosso"



Eles achavam que tinham vencido. Levaram nossa dignidade. Roubaram até nossos ideais. Mas os 20 centavos nos fizeram descobrir quanto vale mudar o curso da história. O povo despertou do coma profundo. Quase duas décadas de inércia, paralisia alienante, desembocaram num grito inflamado, que reverberou pelas ruas do país.

Um formigueiro humano no Centro do Rio. Uma multidão nas ruas de São Paulo. Momentos pra eternidade. Mas nesse 17 de junho, não houve momento mais emblemático, ato mais simbólico, do que a tomada pacífica do Congresso Nacional.
O centro das decisões políticas do país virou o epicentro dos protestos na capital. A melhor representação pro que há de pior na política brasileira ontem ganhou um novo sentido. A marcha começou lenta, subindo a Esplanada a caminho do alvo final. As armas? Faixas, cartazes e o grito preso na garganta que ecoou já próximo ao espelho d´água: "O Congresso é nosso", avisavam os manifestantes.

Dez mil vozes bradando, em uníssono, contra a completa desmoralização da política brasileira. A perpetuação de Sarneys, Felicianos, Renans (e Agnelos, na esfera distrital). Os gastos abusivos da Copa do Mundo e das Confederações. Os instrumentos e mecanismos legais pra garantir a impunidade - traduzida na PEC 37.

Um movimento apartidário, que se vê agora numa encruzilhada: Que caminho seguir? Que agenda política adotar? Respondo a esses questionamentos com outra pergunta. Quem se importa? Melhor um povo que se move por várias causas do que um que se cala por nenhuma.

Brasília estancou um verdadeiro conflito DE gerações - não ENTRE gerações! Os mais velhos revivendo o passado na eterna luta pelo país do futuro que ainda não chegou.

Mas a cara do movimento tinha mesmo espinha no rosto e a coragem típica dos jovens. Eles saíram do facebook. E , como nossos pais já diziam, descobriram que viver é melhor que sonhar. Muitos deles sequer podem votar. Mas já entenderam que basta um pouco de vontade pra mudar o país. Outros, viviam uma espécie de iniciação política – não sabiam bem porque estavam lá, mas impulsionaram o movimento fazendo coro ao grito.

A essa altura, a barreira policial já não conseguia conter os manifestantes, que vinham por todos os lados. Invadiram o teto, ao lado das cúpulas da Câmara e do Senado, imprimindo um novo conceito à estéticaniemeyeriana. O monumento projetado pra que pudesse ser visto a quilômetros de distância, agora mostrava uma faceta desconhecida da cidade.

A rampa do Congresso escoou a multidão que ali se aglomerava e encurtou o caminho para a última trincheira antes da invasão, que parecia iminente.

Milhares reunidos no gramado, a apenas alguns metros do vidro que protege a casa. A veia saltava. O coração acelerava. As pupilas dilatavam. Braços em riste. Quem ali nunca sonhou em fazer justiça com as próprias mãos? Mas esse não seria o desfecho de uma noite gloriosa. Me pergunto se essas horas de tensão serviram pra amadurecer mais a democracia do país ou os jovens que ali estavam.

Histórias cruzadas que ainda vão se entremear tantas vezes - nas urnas, nas ruas ou, porque não, no próprio Congresso? Os manifestantes voltaram pra casa de alma lavada, só que o protesto não parou por ali.


O recado foi dado: ninguém aguenta mais! Eles podem até tapar os ouvidos. Fechar os olhos. Silenciar diante do povo. Mas, com certeza, sentiram o golpe. (Gustavo Serra*)
Gustavo Serra é jornalista, mora em Brasília e acompanhou a tomada histórica e pacífica do Congresso Nacional. "A casa do povo", como é conhecida, assim o foi naquela noite de segunda-feira. 

A rua a quem ela pertence


Ponte estaiada repleta de paulistanos na manifestação de segunda-feira

“O povo acordou” – e não vai mais dormir. A frase entoada nos quatro cantos do Brasil, nesta segunda-feira, era a síntese do que se via por todos os lados: já passava de meia-noite e milhares de pessoas continuavam nas ruas – e nas redes sociais – compartilhando emoções, imagens e memórias de um dia que já virou História no país.
Nunca uma segunda-feira foi tão esperada por tantas pessoas. Cem, duzentas, trezentas mil... O número exato já não importa. O Brasil saiu às ruas como não fazia há tempos. E gritou o que estava entalado na garganta. Não se tratava mais – ou apenas – de 20 centavos. O que começou com uma indignação pelo aumento das tarifas do transporte público virou algo muito maior. Depois de manifestações reprimidas violentamente pelo Estado, as pessoas saíram de casa para relembrar que o espaço da democracia é a rua.
Em São Paulo, a cidade que nunca para – a não ser nos engarrafamentos – milhões de automóveis sumiram do caminho para dar lugar a milhares de pessoas. Mas não foi só ali. Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Porto Alegre, Curitiba, Salvador, Maceió, Belém, Rio Branco... Os protestos se espalharam como pólvora por todo o país.
Mas de pólvora quase nada se viu. O que explodiu no asfalto, dessa vez, foi a mais pura brasilidade. Daquelas que otimismo, criatividade, bom-humor e repulsa  cabem num mesmo cartaz, num mesmo grito de guerra. Democracia, educação, saúde, fim da corrupção, direito à manifestação pacífica, transporte público acessível e de qualidade... Estava tudo ali, num mesmo caldo de reivindicações.
E que, aquilo que nasceu da indignação pelo aumento das tarifas do transporte público, não fique sem resposta. Os governos precisam ceder à pressão da população e oferecer uma solução para a questão do alto preço do transporte, além de se abrir para a elaboração participativa dos planos de mobilidade das cidades.
Após décadas e décadas de incentivo ao transporte privado, está na hora de repensar este modelo exaurido e garantir volumosos recursos em transporte coletivo. O problema da mobilidade urbana nos grandes centros urbanos brasileiros não pode mais ser ignorado. O principal caminho para solucioná-lo é um transporte coletivo acessível e eficiente. (Bernardo Camara*)
*Bernardo Camara é jornalista e morador de São Paulo, de onde participou da histórica noite de segunda-feira, 17 de junho de 2013

segunda-feira, 17 de junho de 2013

#oGiganteAcordou



O Gigante acordou. E não acordou rude, mal humorado, desalinhado. Levantou de um longo sono unido, bonito, pacífico, ordeiro, intenso. Na histórica segunda-feira, 17 de junho, o Gigante reuniu cerca de 250 mil pessoas, em onze capitais, simultaneamente. Impulsionados pelas redes sociais, milhares de jovens saíram do sofá e foram protestar nas ruas. No Distrito Federal, o Congresso Nacional foi tomado por manifestantes de forma pacífica. Emblemática noite de segunda-feira
Mar de gente na Av. Rio Branco. E não era carnaval. Era manifestação 
O Rio de Janeiro reuniu 100 mil pessoas. Todo o tipo de gente no asfalto da Rio Branco. Eram jovens do Ensino Médio, universitários, trabalhadores em geral. Uma brava gente, bem brasileira que cantava palavras de ordem contra o aumento da passagem de ônibus e os gastos com a Copa do Mundo.
O clima era ameno. E uma comunhão de insatisfação gerou um belo espetáculo de cidadania. No asfalto, os jovens eram maioria. No alto dos prédios, pessoas incentivavam a manifestação. Acenando, jogando papeis e piscando as luzes das janelas demonstrando adesão. Lá embaixo, a galera ia à loucura. Sentiam que estavam fazendo história.
Theatro Municipal ocupado sem danos ao seu patrimônio
Os manifestantes atuaram de forma organizada ao longo do trajeto da Candelária à Alerj. Já na rua Primeiro de Março, uma minoria destoou do movimento pacífico e tentou manchar com vandalismo e violência uma noite majoritariamente de paz. As emissoras de tevê aberta até tentaram exaltar só este fato. Mais uma vez as redes sociais, revelaram seu protagonismo. Era de lá que vinha a verdade. O movimento foi registrado por posts, tweets, comentários, fotos. Na Cinelândia, o Theatro Municipal foi tomado em suas escadarias e janelas e emitiu nota, pelo Facebook,  "que durante a manifestação nenhum dos seus prédios sofreu qualquer dano, apesar do grande número de pessoas que participaram da passeata de hoje à noite". 

O Gigante acordou no momento certo. Os olhos do mundo estão voltados para ele. Mostrou sua cara. Sua juventude não é alienada e pode ser engajada. Como já havia acontecido pelo mundo, hoje vimos que no Brasil: “o post é a voz que nos libertará”. Agora é a hora de sair do sofá. (Texto: Thiago Camara. Fotos gentilmente cedidas por Arthur William)